Mudança de vida através da agroecologia: a história de Michele

Michele passou a morar e a trabalhar numa fazenda de eucaliptos em Tremembé em 1998. Trabalhava na propriedade como mão de obra no manejo de remanescentes de eucaliptos, que eram comercializados. A terra da fazenda já estava degradada e improdutiva fazia tempos. Depois de uma série de visitas do INCRA, ficou comprovado que a fazenda não cumpria com sua função social e assim, foi colocada para reforma agrária, conforme designado na constituição brasileira. Michele, então, deixou a fazenda.

Sua irmã, que morava e trabalhava com Michele, passou a participar do MST – Movimento Sem Terra, que buscava organizar um assentamento na fazenda para produzir alimentos. Foi aí que o sonho de ter um pedaço de terra para plantar e cuidar de sua família foi despertado. Michele se juntou ao movimento até que a fazenda se tornou o Assentamento Olga Benário. Para seu sítio, Michele escolheu o nome Boa Vivência, vislumbrando um espaço não só de produção para subsistência e renda, mas um ambiente educativo e de sensibilização para a relação harmoniosa com a natureza, de cuidados com a terra e com a produção ecológica. Hoje, Michele enxerga o sítio como um lugar de troca de experiências e para o futuro, de turismo rural sustentável.

Mãe de seis filhos, entre eles um casal de gêmeos, Michele aposta no resgate do solo e na implantação de Sistemas Agroflorestais no sítio. Hoje, dois de seus filhos trabalham fora, mas ajudam aos finais de semana, e com o sucesso que o SAF vem obtendo, planejam trabalhar com a mãe em tempo integral. Michele inspira amor pelo campo e pela agroecologia até para os filhos menores, que adoram estar com a mãe plantando e colhendo as hortaliças, quando não estão na escola.

No início de suas atividades no sítio, Michele produzia pouca variedade de alimentos em sistema convencional, porém sem o uso de agrotóxicos, e conseguia levar comida de qualidade para casa. No entanto, foi em contato com a equipe do Instituto Auá que inscreveu seu sítio no projeto “Plantio e Restauração Ecológica no Vale do Paraíba e Alto do Tiête- SP”. A partir de então, recebeu o apoio necessário para aprender boas práticas de manejo de agroflorestas produtivas, adquiriu mudas de espécies nativas do bioma e de alimentos de ciclo curto. Por meio de mutirões com assentados vizinhos e com o apoio dos técnicos do projeto, implantou Sistemas Agroflorestais, diversificou a cultura de alimentos, aprendeu a cuidar da produção de uma forma mais tranquila, prazerosa e ao mesmo tempo, mais produtiva.

Michele relembra que para a terra ainda improdutiva do sítio, imaginava uma grande plantação de mandioca. Foi por meio do projeto que percebeu que, além de pouca diversidade, o trabalho em uma monocultura seria exaustivo, pois todos os dias deveria repetir os mesmos cuidados com a plantação, de sol a sol. Com os Sistemas Agroflorestais, descobriu a satisfação de trabalhar na terra com qualidade de vida. Isso porque o SAF permite fazer atividades diferentes a cada dia, evitando a rotina e o tédio, e incorpora árvores para sombreamento, o que beneficia não somente a regeneração ecológica e a qualidade da produção, como também evita a exposição excessiva dos agricultores ao sol. 

Após a implementação do primeiro SAF por meio do projeto, Michele e sua família já colheram mandioca, amendoim, batata doce, maxixe, quiabo, abóbora, entre outros. E as espécies arbóreas estão crescendo muito bem, o que em breve vai permitir a colheita de frutas como cambuci, uvaia, juçara, araçá e outras. Com a primeira colheita, Michele já conseguiu fazer vendas para o consumidor final e incrementar sua renda. O sucesso da colheita a deixou ainda mais animada a continuar com o trabalho.

Desta forma, Michele passou a integrar redes de sementes e outras redes de agroflorestas e uma outra forma de renda surgiu: a comercialização de sementes como a de feijão de porco, guandu, tefrósia, crotalária, entre outras.

Animada, Michele agora tem novos planos. Dentre eles, conquistar a Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) para seu sítio e com isso integrar a cooperativa da região, a COOAAT, podendo acessar novos mercados, além de estar apta a acessar políticas públicas de apoio à agricultura familiar. Quando a safra das frutíferas nativas chegar, pretende comercializar as sementes e expandir as nativas na região.

Hoje, Michele gosta de ficar no campo e de cuidar dos seus SAFs próxima aos filhos e confessa: “Pensei que eu não seria capaz de plantar, manejar e cuidar de uma agrofloresta e graças ao projeto,  junto com os ‘meninos’ enxerguei na agroecologia um modo de vida melhor, mudei minha visão sobre a agricultura e tenho grandes expectativas de uma vida bem mais feliz”.

O projeto “Plantio e Restauração Ecológica no Vale do Paraíba e Alto do Tiête- SP” é realizado pelo Instituto Auá com financiamento do Banco do Brasil e está transformando vidas e a paisagem na região que é estratégica para o abastecimento de água de milhares de paulistas.

Continue acompanhando as histórias de pequenos agricultores que são os verdadeiros guardiões da nossa biodiversidade e da nossa água.

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