População prova milhares de pratos saudáveis no Banquetaço em São Paulo

Mostrar na prática que é possível ter comida de verdade para todos na cidade de São Paulo foi a principal conquista do Banquetaço, movimento que levou para a frente do Teatro Municipal milhares de pratos saudáveis em receitas especiais para a população do centro, no último dia 16 de novembro. Iniciativa apartidária da sociedade civil, traz a bandeira de que a alimentação de qualidade, biodiversa e com alimentos frescos pode alimentar integralmente a população em situação de vulnerabilidade e as crianças em idade escola, inclusive com baixo custo.

A ideia de comida de verdade baseia-se na visão de que os alimentos se originam de práticas agroecológicas, possuem valores culturais e não são somente um conjunto de nutrientes ligados à subsistência. E um direito humano, devendo chegar a todos de forma permanente, regular e em qualidade adequada. Este conceito da soberania alimentar embasa do Plano Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional da Cidade de São Paulo (PLAMSAN 2016-2019), cuja implantação é a principal bandeira do movimento.

Macarrão ao pesto com plantas não convencionais, Cuzcuz paulista com palmito fresco, bacalhau e sardinha, Charuto de folha de uva com risoto de PANC, Sorvetes de Cambuci doado pelo Instituto AUÁ, Limão Siciliano, Uvaia… as criativas receitas vieram da xepa das feiras paulistas, de doações de pequenos produtores, colheitas das hortas urbanas, e foram cozinhadas pelas mãos de diferentes chefs, especialmente da periferia.

“Assim as pessoas ficam sabendo o que podem comer, porque não começarem a se nutrir com o que é saudável ao invés de irem no fast food achando que aquilo é alimento?”, questionou Carlos Magalhães, que passava pelo local e se serviu das porções do Banquetaço. Segundo a chef Neide Rigo, “as pessoas mostraram suas preferências ao escolher o que queriam comer. Uma moradora de rua justificou inclusive que não comeria o cuscuz com bacalhau pois continha animais, ou seja, todos temos hábitos alimentares e isso precisa ser levado em consideração”.

Entre o público presente, houve também agricultores urbanos, como Rita de Freitas Cavalieri, do bairro Casa Verde. “Brinco que hoje fechei a horta, pois queria estar no ato para mostrar que é possível produzir na capital, sem venenos, e atender a demanda alimentar”, reforça Rita, que possui hortaliças e muitas PANC no terreno de 600 metros quadrados e faz parte do movimento de agricultores da Zona Norte.

Mais de uma tonelada de alimentos foram convertidos em 2 mil refeições e 2,2 mil sorvetes, e para isso acontecer, centenas de pessoas se reuniram e organizaram a operação de coleta e preparos culinários. Produtores agrícolas, ONGs, voluntários, chefs de cozinha, nutricionistas, jornalistas, historiadores, colocaram a mão na massa. Verduras, legumes, frutas, embutidos importados, PANC se originaram de doações de todos os tipos, sem que fossem investidos recursos financeiros no Banquetaço.

A qualidade alimentar que é negada pela renda, pela legislação que privilegia a grande indústria, pelos maus hábitos incutidos pela publicidade, pelas políticas públicas que desdenham das necessidades populares, chegando ao cúmulo de propor que, na ausência de “hábitos alimentares”, os pobres deveriam contentar-se com uma ração ultraprocessada, foi o estopim para nossa ação”, destaca Carlos Alberto Dória, sociólogo e um dos organizadores do movimento.

Segundo ele, se existe um Plano Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional, com vigência até 2020, por que a prefeitura de São Paulo não o coloca o plano em prática? “É preciso saber que, quando a prefeitura encaminha à Câmara um orçamento com 92% a menos de recurso para essa finalidade, está cometendo uma violência contra a cidadania”.

Segundo a chef Mara Salles, que preparou receitas no protesto, “foi uma autêntica festa brasileira. Tudo era real e verdadeiro. Num dia iluminado, com liberdade e cidadania, e a tão ausente alegria apareceu tanto nos rostos dos que ofereciam quanto naqueles que recebiam as delícias preparadas com carinho e consciência. Sempre pensei que a cozinha brasileira haveria de encontrar um modelo próprio para se expressar fora de nossas fronteiras. Não seria por aí?”.

No mesmo dia, a prefeitura de São Paulo anunciou a revogação da lei da Farinata (lei 16.704 de 2017) e a decisão de ampliar os orgânicos na merenda escolar, que já são pautados pela lei em vigor 16.140 de 2015.

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