Gado dá lugar ao Cambuci e tem início novo ciclo produtivo em Natividade da Serra

Diferente de muitas propriedades familiares na Serra do Mar Paulista, a história da fazenda do produtor Milton Martucelli Júnior implicou no resgate da paisagem original sobre extensas áreas antes desmatadas para ocupação pelo gado. Na fronteira de Natividade da Serra, centro do Vale do Paraíba, a propriedade de 350 alqueires foi um dos negócios importantes da família com a criação do gado nelore em larga escala, até a existência de pés de Cambuci na área causarem um grande problema na atividade.

Os animais vinham consumindo fartamente a fruta caída no chão e, devido à sua forte composição, passaram a sofrer com diarreia e muitos chegaram a morrer. A providência mais direta dos proprietários foi realizar o corte dos pés de Cambuci da área, e foi justamente o efeito dessa atitude que reverteu o histórico da fazenda, contribuindo para a descoberta de um novo ciclo produtivo e de sustentabilidade no local.

Como a árvore é nativa da Mata Atlântica e encontra-se ameaçada de extinção, o Ibama obrigou o replantio dos Cambucizeiros derrubados e, naturalmente, Milton foi percebendo que as propriedades da fruta poderiam servir a certos usos diferenciados. Notou pela primeira vez o aroma agradável do Cambuci ao entrar na casa de um dos funcionários da fazenda e sentir o cheiro da geleia feita com o fruto na cozinha. Assim, passou a fazer testes em casa e experimentar algumas aplicações culinárias.

O forte perfume do Cambuci logo mostrou seu potencial de aproveitamento, levando o produtor a desenvolver um xarope para o outro negócio da família. Há anos, eles fabricavam a conhecida cachaça artesanal Angelina, que também vinha necessitando de um diferencial de mercado para o crescimento do negócio. A elaboração do xarope de Cambuci permitiu a introdução na cachaça, que se tornou mais atraente e, depois de aprovada por amigos e conhecidos, passou a conquistar o mercado em grandes cidades.

Outra mudança importante aconteceu no ano de 2007, quando houve a decisão da família por vender todo o rebanho da fazenda, junto com cerca de 320 alqueires da propriedade. Os 30 alqueires restantes tornaram-se então o berço para o cultivo dos Cambucizeiros, com 100 árvores iniciais plantadas, que chegaram a render até 20 toneladas do fruto por ano. Isso se traduzia em 3,5 mil litros de xarope, produzindo em média 15 mil litros de cachaça de Cambuci.

Apesar do crescimento do negócio, com a bebida sendo comercializada em redes como Pão de Açúcar e St. Marché, aos poucos o trabalho passou a enfocar a comercialização do Cambuci produzido na propriedade.

Hoje, a terra já possui quase 1,5 mil pés de Cambuci, e segundo Milton, são 100 pés adultos, com mais de 10 anos, 700 pés adolescentes e 600 pés crianças, ainda com 3 anos. “Brinco que são meus filhos, crio eles com carinho e, este ano, os pés adolescentes já deram uma produção razoável”, diz. Segundo ele, trata-se de um cultivo artesanal, que inclui delicadeza na coleta manual dos frutos, diferindo das colheitas em larga escala que permitem o uso de maquinário adequado.

“Tudo isso faz do Cambuci um produto exclusivo e premium, para o qual vejo potencial de mercado em segmentos como o da alimentação saudável e o próprio mercado internacional. Isso porque está baseado em um manejo sustentável, possui alto rendimento, além de todas as propriedades vitamínicas cada vez mais reconhecidas”, destaca.

Seu vínculo com o fruto também impulsionou uma nova atuação dentro do Instituto Auá, que vem lutando para tornar o Cambuci mais valorizado e promover a recuperação da Mata Atlântica no Sudeste. Como representante comercial do Empório Mata Atlântica, da ONG, Milton vem trabalhando hoje para introduzir o fruto em diferentes redes do varejo e permitir um maior conhecimento pelo público paulista.

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