Jonatas e o sítio Seu Jonas: do conhecimento dos antepassados às tecnologias agroecológicas

O início 

Durante os últimos 26 dos seus 38 anos, Jonatas Emídio Soares tem vivido no Sítio do Seu Jonas, localizado no Lote 1 do Assentamento Casa Grande em Biritiba Mirim, região do Alto Tietê – SP. Atualmente mora e trabalha no Sítio com a esposa, Cintia Aparecida Amaral Soares, e juntos mantêm uma produção que caminha cada vez mais para um caráter agroecológico. Porém, essa história começa há muitos anos atrás, com a vinda do seu pai, que cresceu no meio rural no interior da Bahia, para São Paulo.

Quando chegou na cidade grande, o pai, Jeonício José Soares, Seu Jonas, começou a trabalhar em uma grande fábrica, e logo conheceu quem viria a ser a mãe do seu filho, Dona Josefa Emídio Soares, que também veio do meio rural, no sertão do nordeste. Os dois se apaixonaram e se casaram, e então decidiram fugir do caos e violência da cidade. Assim procuraram uma chácara no ambiente do campo e encontraram em Biritiba Mirim, para onde se mudaram. O sonho dos pais era voltar a viver de plantar e colher alimentos, entretanto, a chácara era pequena demais para tais atividades e seus recursos eram escassos. Mas, prontamente, surgiu uma oportunidade para o casal. 

Em 1985, o tio de Jonatas, que era fiscal de uma fazenda em Biritiba, ficou sabendo que o local estava passando por um processo de ocupação pelo MST, pois estava improdutivo seguindo os critérios do Incra. A fazenda havia sido produtora de eucaliptos, mas já há um tempo estava sem produção. Portanto, o tio avisou o seu Jonas sobre a possibilidade de se unir ao movimento e conquistar a terra para a agricultura familiar. 

O lote que ficou disponível para a família infelizmente estava cheio de tiririca (ervas daninhas), o que impossibilitava a utilização para a agricultura. Então, sem demora seu Jonas começou a limpar o ambiente de forma manual, indo e vindo todos os dias da chácara para o lote. Quando o terreno finalmente ficou apto para o cultivo, iniciou-se o plantio a partir dos conhecimentos tradicionais dos antigos conforme havia aprendido na Bahia com seus antepassados: plantar os alimentos em consórcio! Assim, alimentos como batata-doce, quiabo, pimenta cambuci, berinjela, pepino caipira e espécies como milho, feijão e mandioca passaram a crescer pelas terras do sítio, tendo o milho para a função de sua palha ajudar na manutenção do solo. Seu pai não sabia o nome técnico “consórcio”, mas já utilizava a técnica, pois fazia parte da cultura de onde veio. 

Quando os trabalhos com agricultura despontaram no Lote, o uso dos agrotóxicos na região era predominante, mas o Seu Jonas, pai de Jonatas, resistia a seu uso, uma vez que o sistema e a forma que aprendera eram bem sucedidos sem eles. Com isso, o sítio acabou se tornando um modelo de rotação de cultura para os demais sitiantes da região. O pai tinha conhecimento empírico sobre quais as melhores épocas e climas para se plantar cada cultura e até se orientar ao plantio por meio das épocas de chuvas. Por conta disso, os resultados sempre foram uma colheita farta e com alimentos de alta qualidade, que se sobressaiam aos outros plantados com agrotóxicos na cidade. O ecossistema trabalhava à seu favor e mesmo com as dificuldades encontradas no modelo ecológico, como controle de pragas, o produto final era muito bom e isso o satisfazia.

Lamentavelmente, após alguns anos, seu pai veio a falecer. Diante disso, Jonatas se manteve forte e seguiu em frente. Assumiu o sítio, batizando-o carinhosamente em homenagem ao seu pai com seu apelido. Agora, com sua recém esposa, Cíntia, dá sequência à agricultura familiar, com foco na produção de banana tendo em vista que é o principal alimento que comercializam. A produção de banana é livre de agrotóxicos. Isso porque, Jonatas também é apaixonado pela natureza e acredita que em primeiro lugar deve se preocupar com o meio ambiente e depois com a renda vinda do sítio. Sua missão é preservar e recuperar a flora e a fauna do seu local.

Primeiros contatos com tecnologias agroecológicas

A partir do contato com o Hamilton Trajano, ex- técnico agroecológico do instituto Auá, que se deu através de um projeto realizado na região, por meio do Fehidro, em 2018, começou uma nova etapa em sua vida. Deste encontro, Jonatas compreendeu que poderia planejar seu sítio a partir dos Sistemas Agroflorestais, utilizando espécies nativas da Mata Atlântica, além de aprender a construir um croqui para a sua propriedade, definindo as espécies que seriam plantadas. Também educou-se sobre novas tecnologias sustentáveis e agroecologia, o que passou a fazer com entusiasmo. Com esses novos conhecimentos, plantou 73 espécies de mudas nativas – frutíferas e raras, em corredor ecológico entre as duas partes do seu lote. Tal corredor se localiza em Área de Preservação Permanente e dali Jonatas também coleta sementes com as quais produz mudas em um pequeno viveiro. Ele agora pretende ampliar para suprir a demanda local por mudas de espécies nativas. 

Jonatas também trabalha com a produção de mel com abelhas nativas, como a jandaíra. Fazendo essa produção no corredor ecológico, ele lembra que as abelhas nativas são importantes para a polinização e que o mel produzido por elas possui propriedades medicinais, havendo aumento da procura também por este produto.

O produtor conta que a parte debaixo do seu lote era uma grande várzea e, portanto, muito inundado, por isso difícil de produzir alimentos. Além disso, na área de várzea, que acumula muita água, há o risco da proliferação do mosquito da dengue, mas Jonatas aprendeu com os técnicos que a plantação de clotorália atrai libélulas que naturalmente eliminam os mosquitos. Porém, uma vez com a ajuda do projeto do Instituto Auá, ele aprendeu a trabalhar o solo e torná-lo pronto para implementar um Sistema Agroflorestal que tanto queria. Conforme as orientações do técnico do Auá, após iniciar a plantação, Jonatas precisou fazer alguns ajustes para corrigir a acidez do solo.  Assim, ampliou a plantação de limão, mirtilos e outras espécies que se adequam melhor a este tipo de solo.

Por conseguinte, seguiu com suas atividades e quando soube do novo projeto “Capacitação Agroecológica no Alto Tietê” se animou para adquirir novos conhecimentos, teóricos e práticos para implementar no sítio. Desse modo, com as oficinas e das visitas do técnico agroecológico Adrian Pereira, descobriu que poderia consorciar espécies com sua plantação de banana, como o feijão de porco, guandu, girassol, etc, assim como fazia o seu pai, além de produzir biomassa para adubação do solo e assim enriquecê-lo. Adrian o ajudou também a fazer a cobertura natural e a correção de acidez do solo com o plantio de abacaxi, mamona e cana, algo que Jonatas não sabia que era possível.

A cura do Bananal 

Entretanto, o grande impacto das visitas técnicas se deu no momento em que o bananal do sítio apresentou uma doença que o ameaçava. O técnico Adrian logo identificou que a doença ocorreu devido a área estar muito sombreada e úmida e um vírus que se proliferou. Com medo de perder toda a sua plantação e assim sua maior fonte de renda, Jonatas pensou em comprar agrotóxicos para exterminar a doença, mesmo sem vontade de agredir o solo com esta opção. 

Mas rapidamente Adrian, com larga vivência com agroecologia, além dos conhecimentos teóricos, apresentou uma solução que salvou o bananal do problema e confirmou para Jonatas este caminho de sustentabilidade: os Insumos Biológicos. Economizando no custo com agrotóxicos, ele seguiu as orientações do técnico, que funcionaram! Com a utilização dos Insumos, que começou parcial e depois do primeiro sucesso se tornou total, e a retirada das folhas infectadas pela doença para não infectar as plantas sadias, o bananal logo se curou.

Utilizou insumo biológico que aprendeu a fazer nas oficinas e aplicou em parte do bananal para comparar seu desenvolvimento com a outra parte sem aplicação e constatou melhora na produção além de ser de baixo custo. Ele fica especialmente grato por não contaminar o solo e preservar o meio ambiente, especialmente os recursos hídricos que estão no local. Com a vinda do projeto Jonatas aprendeu novas formas de manejo que agregou no plantio de banana em larga escala, assim ele é o único produtor de banana agroecológica da região. Apesar dos desafios, o técnico do Instituto Auá esteve sempre ao seu lado para encontrar as soluções adequadas e sustentáveis.

Com 6 meses de aplicação das tecnologias agroecológicas apresentadas ao longo do projeto, Jonatas relata que percebe os seguintes resultados:

  • desenvolvimento mais rápido das mudas
  • tonalidade mais viçosa e mais verde das plantas e alimentos
  • erradicação da doença que afetou o bananal
  • menos custo com insumos
  • implementação do minhocário e da composteira que provê o chorume para adubação do solo e para comercialização

As nativas da Mata Atlântica

Jonatas conta que há 4 anos encontrou em seu sítio um fruto misterioso. Após uma intensa investigação, descobriu se tratar da Eugenia Monosperma, conhecida popularmente como Cereja do Brejo. Após essa descoberta, ele então passou a produzir mudas desta frutífera para garantir sua existência no futuro, já que se encontra em vias de extinção.

No fundo do seu sítio se encontra uma mata nativa que fica aproximadamente a 1000m do Rio Tietê que ali passa ainda com águas cristalinas! Jonatas decidiu investigar quais outras espécies nativas raras se encontravam ali para reproduzir mudas a partir delas, e assim ofertar em doação ou comercialização para os vizinhos e consumidores em geral. Ali encontrou grumixama, pitanga preta, cereja do rio pardo, jabuticaba de cipó, entre outras muito raras. Sua ideia é ter um amplo viveiro no sítio para espalhar estas árvores esquecidas. O agricultor se apaixonou pelas espécies nativas e agora  tem planos para expandir seu plantio no sítio, pensando a longo prazo também comercializar seus frutos. 

Além das nativas, Jonatas aposta nas PANCs, como o ora pro-nobis, que já cultiva em consórcio com hibisco, caramoela, uma trepadeira muito procurada, e cará insulina, que é ótima para diabetes, que ele comercializa devido a alta procura. Ele também passou a integrar grupos online e redes de produtores de nativas e PANCs para troca de conhecimento e divulgação do seu trabalho. O produtor tem a intenção de continuar participando das capacitações e projetos do Auá, uma vez que estes impactam diretamente na sua conscientização ambiental e práticas mais eficientes no sítio.

O projeto é realizado pelo Instituto Auá, com a FEHIDRO, e vem educando cada vez mais sitiantes sobre a importância de técnicas agroecológicas.

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