Vamo Comer

Por Bely Pires
diretora do Instituto Auá

“Vamo comer
Vamo comer feijão
Vamo comer
Vamo comer farinha
Se tiver
Se não tiver então (….)
Vamo comer
Vamo comer canção
Vamo comer
Vamo comer poesia”
(Caetano Veloso/Toni Costa)

Tudo o que se come vem da natureza. Por mais industrializado que seja o alimento, sempre estaremos ingerindo algo primordialmente originado dos ecossistemas. Claro que a licença poética de Caetano Veloso nos permite comer canção e poesia, mas tão importante quanto a necessidade de cultura, é saber que a provisão de alimentos é um serviço ecossistêmico, obtido graças a existência da natureza.

Qualquer alimento é conseguido a partir de um sistema terrestre ou aquático, seja por meio da extração ou da produção agropecuária. A Região Metropolitana de São Paulo, com seus quase 20 milhões de habitantes, é uma enorme consumidora desse serviço ecossistêmico, o qual vem sofrendo a décadas com o impacto da expansão urbana. Essa expansão ocorre em um território antes usado pela agropecuária, principalmente para os hortifrutigranjeiros que abastecem o mercado interno de alimentos.

Outro impacto desse cenário é a queda da qualidade e quantidade da água, recurso fundamental para a existência do serviço de provisão de alimentos. E assim, tudo leva a produção alimentar a ser cada vez mais empurrada para longe da grande metrópole, encarecendo tais produtos.

Uma reflexão mais técnica sobre o tema pode ser obtida no capítulo “O Produtor e o Serviço Ecossistêmicos de Provisão de Alimentos”, coordenado por Yara Carvalho, presidente do Conselho de Gestão da RBCV, dentro do Sumário Executivo da publicação “Serviços Ecossistêmicos e Bem-estar Humano na Reserva da Biosfera do Cinturão Verde da Cidade de São Paulo” (http://www.ahpce.org.br/newsite/images/materiais/sumarioexecutivo.pdf).

Outra importante discussão sobre a provisão de alimentos está em sua contribuição para o bem-estar humano, especificamente por proporcionar renda para quem produz, boa saúde física, mental e boas relações sociais para todos.

Num passado não tão remoto, qualquer alimento vindo da terra ou da água, vegetal ou animal, não continha nada além do que o ecossistema oferecia naturalmente. Assim o ser humano se desenvolveu, chegando ao grau de conhecimento que tem hoje. E esse conhecimento vem sendo muitas vezes mal utilizado, já que as pessoas precisam de boa alimentação para garantir seu bem-estar, e se alimentar bem significa não ingerir veneno ou alimentos modificados à revelia de quem os consome.

Isso significa respeitar os ecossistemas de modo a manter sua capacidade de provisão de vários serviços, como os alimentos saudáveis. O uso intensivo de agrotóxicos, adubos químicos e produtos transgênicos inviabiliza o fornecimento desse serviço.

O Instituto Auá apoia a agroecologia e a agricultura orgânica, trabalhada por pequenos produtores ou produtores familiares, cujo produto leva a má fama de ser inacessível por ser caro (produto de elite). Infelizmente, quem leva a maior parte desse dinheiro não é o produtor e sim o distribuidor (supermercados).

Queremos ver o pequeno produtor de orgânicos respeitado por seu trabalho e por sua contribuição para a manutenção dos ecossistemas e seus serviços de provisão e regulação de água, regulação de solos, serviço de suporte e da biodiversidade, dos serviços culturais ligados a identidade (cultura caipira) e ao turismo rural, entre outros.

Por isso, apoiamos os empreendimentos socioambientais como a Banca Orgânica (link) e a Rota do Cambuci (link). Nesse sentido, um importante passo dado pela sociedade civil e Assembleia Legislativa no Estado de São Paulo é a criação da Frente Parlamentar “Ondalva Serrano” em Defesa da Produção Orgânica e Desenvolvimento da Agroecologia, que tem como objetivo construir políticas públicas de apoio a essa causa, e conta com o intenso trabalho da fundadora e conselheira do Instituto Auá, que dá nome à Frente. Ela será oficialmente lançada no dia 22 de junho, às 14 horas, na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.

Por outro lado, lutamos contra os agrotóxicos que podem trazer problemas de saúde para quem os utiliza na produção e para quem os consome por meio dos alimentos, cujas embalagens não contêm uma “bula” onde se poderia consultar os efeitos colaterais decorrentes de sua ingestão. E por falar em embalagens…

O Instituto Auá não aceita os transgênicos e se tivermos que conviver com eles, que tenhamos o direito de saber onde estão! Que tenhamos o direito de não os escolher. Ninguém pode impedir que se saiba o que se está comendo.

Além disso, os transgênicos geram um perverso efeito econômico: criam a dependência entre o pequeno produtor e as poucas empresas produtoras de sementes transgênicas, um grupo de seis grandes corporações (Monsanto, Dupont, Syngenta, Basf, Bayer e Dow), ferindo totalmente nossos valores de sustentabilidade e comércio justo.

Somos contra o Projeto de Lei 4148/2008, que desobriga a identificação de componentes transgênicos nos produtos alimentícios, ferindo nossos direitos previstos no Código de Defesa do Consumidor. O Instituto Auá assina a carta solicitando a não aprovação do PL no senado!

Então

Vamos comer arroz, farinha (orgânicos)

Vamos comer canção e poesia (belas)

Se tiver

Se não tiver então

Vamos apoiar sua produção!!!

Saiba mais sobre agricultura orgânica nos sites do Instituto Auá e no site da Associação de Agricultura Orgânica (AAO)

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